CAPÍTULO 11 - O Mágico Clarão Espírita

Nos primórdios as doutrinas consagraram o sobrenatural como santo, mas à medida que o Estado Teocrático se impôs as religiões refutaram toda mediunidade nascida fora de sua estrutura dominadora, surgida nos povoados longínquos, nos seios mais humildes, competindo pela intimidade de Deus. Desde os primeiros concílios, visando a uniformização dos dogmas, o preço da unificação foi o expurgo da mediunidade, pois o sobrenatural admitido em doutrina abriria portas para uma existência paralela de poder, induzindo os seguidores a uma orientação direta com as manifestações mediúnicas, diminuindo o status e o domínio dos representantes da fé.

O interesse em não perder o controle político requereu uma forte recriminação dos fenômenos mediúnicos que se sucediam nas pessoas mais simples, desviando a crença, o culto e as atenções dos centros de fé para as glebas distantes. Essa censura estendeu-se pela idade média, alcançando apogeu na inquisição para desdobrar a partir do iluminismo no Estado laico que hoje vivenciamos. Após a Revolução Francesa o Estado Teocrático inicia sua cessão para o Estado Republicano, que despreza a dominação religiosa e desarticula sua capacidade ofensiva de sobrepujar minorias sectárias. Ainda assim, as doutrinas estabelecidas relutaram na disputa pelo mercado da religiosidade, não mais provida de uma força inquisidora, mas espalhando uma depreciação injuriosa sobre a prática mediúnica.

Nesse cenário a Europa do século XIX assiste o fenômeno das mesas girantes, a partir de reuniões nas casas burguesas e nos palácios da nobreza estabelecendo moda em intensidade capaz de atrair renomados nomes da ciência de sua época. O fenômeno inicialmente lúdico desencadeia o nascimento do espiritismo como doutrina, copulado da união do místico com o científico, tomando corpo através das publicações da Revue Spirite, para mais tarde iniciar sua coletânea a partir do Livro dos Espíritos. Sua fundamentação teológica tem raízes na Índia, a partir da crença da reencarnação em outras vidas, porém, com refinamento de um progresso evolutivo, já que o espírito inteligente não poderia retroceder ao reencarnar no corpo de um animal, de um vegetal, ou mineral.

Apesar de um relativo sucesso inicial o espiritismo não prosperou correspondentemente à importância do tema que aborda. Sucedeu que o movimento das mesas, copos e outros instrumentos foram elucidados como efeito ideomotor da radiestesia, inconsciente e involuntário, mas capaz de mover objetos intuitivamente, embora essa explicação não tenha convencido a totalidade dos cientistas que vivenciaram tais fenômenos. Também é apontado que muita ilusão se instaurou no vácuo do verdadeiro espiritismo codificado por Kardec, pois os impostores viram aí uma lucrativa fonte de renda diante da novidade que assolava os teatros e salões da nobreza. Muitos novos conceitos foram estudados e elucidados, porém, nem tudo foi entendido e desmistificado pelas mentes mais brilhantes de seu tempo, restando fenômenos verdadeiramente sobrenaturais que por sua incompreensibilidade ficaram relegados a categoria das fraudes.

Tais encenações retiveram o avanço do espiritismo que praticamente esmoreceu com o desvio de atenção causado pelo início da primeira grande guerra. Mas germinou na terra mais fértil, desenhada na forma do coração, que congregou todas as raças e suplantou o preconceito, se deparando com culturas indígenas e africanas adeptas da veneração dos espíritos, dispondo assim uma base ideológica compatível à sua aceitação. Essa tradição cultural deu sustentação à doutrina espírita por seu traço comum, e a conversão religiosa tão arduamente preparada pelos padres jesuítas abriu caminho para aceitação do espiritismo branco, que se consolidou no estudo do evangelho e na estruturação dos centros espíritas, de casas baixas, de paredes finas e sem nenhuma suntuosidade.

No século seguinte enquanto o espiritismo progredia rasteiramente, as doutrinas estabelecidas exerciam o controle mercadológico fazendo ver o sobrenatural como incômodo e satânico, porém, toda essa resistência testemunha a favor do próprio espiritismo demonstrando seus méritos em sobreviver a toda injúria. No futuro, talvez a atenção popular direcione seu interesse ao conhecimento pós-morte, por ora, o que parece ser é que novamente os homens estão mais propensos a acreditar o que foi feito pelo próprio homem, ante o que vem de mais perto de Deus.

A ninguém é dado degradar o que desconhece, e embora o sobrenatural tenha sido difamado, foi nos ensinado que um reino que se divide não pode subsistir, e também que pelos frutos se conhece a árvore. Portanto, se uma doutrina prega o bem e realiza o bem com mais objetividade e vigilância, não pode ela servir ao mal. O senhor do mal seria também imperito como recrutador de um reino, porque sendo hábil na ilusão, não afugentaria seus pretendentes ao se revelar através de espíritos grosseiros, cuja origem é igualmente de natureza humana.

A doutrina espírita não reconhece a personalidade satânica, mas vê o mal como uma condição rude e primária de uma ausência de Deus. Reconhece a existência do bem que adverte do mal, e não de um lado mal que difama o bem. Enquanto um Se mostra e Se faz provar, o outro é invisível e relatado como serpentes e dragões de chifres e cabeças, com fogo e enxofre descritos pelo primeiro, que encontra crédito em nosso medo e nossa fraqueza interior. Um é Ser provido de todas as qualidades, o outro é pura insensatez, ousadia e teimosia em desafiar a onisciência e onipotência do Eterno. Mas Deus deve ser tudo e não apenas o bem, porque onipotente não pode ter rivais nem inimigos e tudo se sucede sob Seu comando, ou então não seria Deus, mas apenas uma causa em luta com outra, que como Soberano consente a existência das forças opositoras.

Mais lógico seria pensar que o mal nasce em nós pela essência carnal, animal, brutal, da força dos desejos e dos hormônios que nos arrebatam a lutar e a sobreviver. Somente como seres que ascendem à intelectualidade é que percebemos nossa própria maldade, pois o leão não se arrepende do cordeiro que abate, porque sua inteligência ínfima não lhe dá esta percepção, ele simplesmente ataca o cordeiro porque tem fome e após comê-lo se acalma e singelamente se amansa. A inteligência é que nos dá a percepção do meio a nossa volta e disto vem o reconhecimento de nossa prioridade ao sofrimento alheio, e conseqüentemente do egoísmo que denominamos mal.

Nessa linha, a ideologia espírita repensa as teologias numa versão mais tolerante, pois se somos apenas servos, o senhor haverá de escolher entre os melhores deixando de aproveitar os demais. Mas se somos filhos do Pai infinitamente misericordioso, Ele nos submeteria a um processo de correção, aprendizado e evolução contínua, no qual até o mais atrasado de Seus rebentos, pela imensidão do tempo se elevaria à Sua infinita grandeza. De maneira que todos, mais cedo, ou mais tarde alcançariam o maior grau de purificação, não excluindo assim nenhum de Seus filhos, nem o mais cruel ser que tenha vivido nesta terra. A versão espírita sepulta a figura satânica, para de uma forma lúdica compreender o mal como um fomento ao bem, em que exercendo sua função, impôs ao opositor o exercício e seu conseqüente desenvolvimento.

Sabemos que um dia para nós é como mil anos para Deus e que um dia para Deus é como mil anos para nós. Por isso o espírita não exaspera na pressa, pois Aquele que domina a eternidade não se antecipa, porque mais cedo, ou mais tarde todos convergem para Si. Já o senhor que tem vida limitada se apressa por seus anseios, é cruel pela insegurança de não conseguir realizar sua obra e apenas Aquele que não tem fim é capaz de ser plenamente bom e justo. Temos a percepção de três tempos: o tempo de existência do universo, o tempo de nossa existência e o tempo da existência futura, infinitamente maior que todos os outros tempos. Se a vida humana é menos que um fio de cabelo e é Deus maior que o universo e que o tempo, e que só há vida em Deus, é óbvio que quem viver com Deus no presente, com Deus viverá no tempo futuro, muito além do tempo do universo, mas multiplicado por toda a eternidade.

Nesse passo, a doutrina espírita acalma os anseios pela purificação, estando garantida a todos que se despojem a avançar, sendo o que separa o céu do inferno apenas o tempo pelo qual devemos evoluir, não havendo pecado, não havendo castigo, existindo apenas uma evolução eterna. E assim, entende as dores como méritos que elevam a alma por cumprir débitos de uma etapa futura, sendo estas austeras lições de que a felicidade não se encontra nas coisas da matéria; e para julgar sua origem, se se admite que a substância esteja fora de Deus, ou de Seu domínio, então Ele não será infinito.

No espiritismo cada um diz o que quer, pois não há patentes nem hierarquia, mas apenas referências. Sabemos a lição e não serviremos a dois senhores, somos capazes de distinguir as ambigüidades; pois o poder de destruir todos tem, mas força para curar só aquele que for dotado de Seu poder, e força para ressuscitar só aquele que for ainda mais dotado, enquanto o poder maior está com Aquele capaz de dotá-lo de Seu próprio poder, e esse é o lado do qual queremos todos estar.

É de se considerar que sendo o homem criado para uma única existência encarnada, tendo cada ser início com o nascimento, então a vida institui-se na própria dimensão material, sendo de esperar que cada ser por ter um começo, haveria também de ter um término e tal suposição requer a onipotência de Deus para que a vida seja resgatada na ressurreição. No entanto, decorrendo uma sucessão de encarnações, a origem específica de cada ser se perde da matéria para ocorrer em espírito, sendo de se esperar que se algo incompreensivelmente se ausenta de início, é igualmente capaz de eximir-se de um fim.

No mundo presente a justiça é falha, e pressupô-la na integralidade necessariamente faz imprescindível um segundo mundo de recompensas e tribulações, a fim de prolongar em tempo e oportunidade a vida encerrada nesta Terra, que no período visível e conhecido de todos se mostra tão disparatada. Porém, o paradoxo das injustiças sociais e individuais, não faz prova da necessidade de reencarnação, porque pessoas com atitudes iguais em situações idênticas podem ter mérito distintos se distintas forem as descargas hormonais de cada uma destas, cujo parâmetro nos é desconhecido. Condenamos o maníaco pelas suas ações, mas desconsideramos a força hormonal e a história de sua criação, agindo na conseqüência e desmerecendo a causa. Assim, o processo de reencarnação pode ocorrer como plano do desenvolvimento individual de cada ser, mas sua fundamentação de justiça só é válida se contemplar as forças hormonais, individuais e motivadoras de cada ação, ou omissão, de conhecimento único do Criador, eis aí a onisciência de Deus.

Na premissa do amor a Deus, oraríamos por todo o tempo de nossa vida, desde o abrir dos olhos ao amanhecer, até o fechar dos olhos ao adormecer, e só cessaríamos de orar diante da urgência e das prioridades do dia a dia. Porém, muito mais conta o espírito construtivo do homem, que trabalha, elabora e cuida dos que necessitam de amor, amparo e alimento, já que a fé sem obras é mesmo morta, pois aqueles que amam Sua causa amam a Ele próprio mais que aqueles que amam a Ele e não amam a Sua causa.

Em toda construção está implícito um planejamento, pelo qual cada acontecimento tem seu momento e toda verdade parece ter sua hora, porque O mais elevado se guardou de verdades que sabia, e das que não sabia, disse Quem saberia; e diante de algo tão decisivo e determinante quanto uma revelação irrefutável, sentir-me-ia à vontade para aceitar o que não percebo, pois mesmo do que é conhecido muito ainda não entendo e sei que do que há para se conhecer, muito menos compreendo. Existindo um reino que rege o universo, Seu mentor, Seu criador e Seu interlocutor se farão declarar, porque para cobrar é preciso antes ensinar. Então se fez necessário primeiro um Guia que se revelasse publicamente, para depois a ordem de tal reino se revelar pessoalmente, em um poder desconcentrado e espalhado por todo o planeta, para que assim se possa dar testemunho, não de algo sobrenatural apenas, mas de uma convicção fundamentada na existência de vida pós-morte.

Assim como Saulo foi chamado pela luz que o cegou, muitos serão convocados a participar da messe, e não se assustem pelos mártires do passado porque no início o homem era politeísta, mais entendia o sacrifício que a caridade, e quanto mais rude mais material se mostra, e da mesma forma quanto mais evoluído mais desmaterializado se torna. Nesse sequência, observamos que as revelações tiveram de ser dosadas segundo a capacidade de entendimento de cada época, pois a natureza rústica do homem primitivo não permitia um Deus misericordioso na totalidade, já que como bárbaros somente a força entendiam e tal imagem não representaria Deus, mas apenas um ser fraco sem força de se fazer obedecer. Ao homem atual é oferecido um plano de livre arbítrio e sem castigo, em que o mundo espiritual faz do mundo material um campo de prova, onde o erro é inerente ao ainda ignorante, que se abstendo neste, propicia sua evolução naquele.

A mediunidade como fenômeno data de milênios, mas o espiritismo codificado que transformou o místico em ciência, ocorreu há um século e meio, tendo seu crescimento proporções modestas pela relevância do que trata. Pois sendo o colapso corporal inevitável, deveria todo homem investir no mundo material passageiro, para colher no mundo espiritual perene, mas a timidez com que se desenvolve a doutrina espírita se deve pelo desvio da atenção e pelas tentações do mundo ante o que é crucial. O momento em que o espiritismo lança seus esclarecimentos, bem como essa marcha morna com que se desvenda o medo pelo sobrenatural, se ajusta com o grau de compreensão de nossa época, pois se imaginássemos uma revelação espiritual completa desde os primeiros milênios, em que o sentimento de fraternidade se alastrasse nos corações de tantas criaturas, que o excedente de poucos se desse à falta de muitos, o conceito sobre a mais valia da eternidade esvaziaria o querer da vida mundana, que pela parte saudável de sua usura e ambição permitiu aos homens construir o mundo que hoje vivenciamos.

O entendimento da sobrevivência espiritual transcende a compreensão da matéria, alimentando naturalmente o enigma; se tudo fosse transparente a dúvida não residiria e seríamos distintos de como somos, visto que num primeiro momento a vida se preenche pelas conquistas, as mesmas com que construímos o mundo, mas transcorrida sua primeira metade, vivemos segundos de reflexão do sentido de tudo que passou. Assim, se o espiritismo nascesse referendado teria dilacerado todas as religiões de templos ainda existentes e arrastaria todos os homens a sua doutrina pelo mérito da racionalidade; porém, sua função é de iluminar para fazer ver o sobrenatural sem ferir a fé. Na química do universo o Criador permitira a codificação espírita, inserindo certa dose do elemento certeza para reagir ao iluminismo que se alastrou; mas a certeza é destruidora da fé e onde houver a mácula da inocência, haverá também a leveza de quem arrasta montanhas.

A certeza que diminui as inquietações igualmente onera em obrigações, sendo esse seu preço que conterá a maré espírita a não devorar todas as primitivas doutrinas, alimentando o consenso de suas existências. Por se tratar do que mais precioso pareça, a semente espírita cresce lenta porque jamais apresentou viabilidade econômica, pois ainda é tempo do ter, mas o produto que oferece é mais procurado e de mais valor que água no deserto, porque embora alguns possam se eximir de comprar água por terem seu próprio poço, o corpo físico é insofreavelmente deteriorável e para onde vão sirvam-se em seus conceitos do mapa de onde pisarão. As versões materialistas geram dúvida ao espiritualismo, resgatando o lado da fé, pois se certo fosse desprezado seria o seu valor, que sufocada pela convicção, se perderia de espontaneidade para se cobrir de obrigação. Assim, o espiritismo é um confortador para uns e incômodo para outros, porque antes de vê-lo pelo sobrenatural, ainda se tinha desculpa das culpas e omissões, mas depois que o espírito da verdade toca a razão, passa-se a ter uma consciência da relação dos mundos em seu prosseguimento de justiça, tornando claras suas responsabilidades.

O espiritismo tido como doutrina experimental, totalmente versada nos fatos, vem para mostrar que o alcance da vida pode estar muito além do que normalmente pensamos. Negar a continuidade da vida é justificar cada acontecimento às parcas leis que tateiam e tomar o espírita como iludido, iludindo a si mesmo. Admitir a continuidade da vida é ser sensível e ao mesmo tempo comodista diante dos fatos mediúnicos que negligenciam, mas asseverar-se da continuidade da vida é ser vigilante e atuante em conformidade com a sua evolução. A doutrina contempla o aperfeiçoamento do espírito como fruto do seu próprio labor, dentro de um elevado gradiente de luz que já de início ofuscaria os espíritos pesados, ligados à matéria e que vivem rasteiros, enquanto os espíritos mais puros conseguem por sua leveza adentrar estágios de maior luminosidade, que quanto mais forte é a luz, maior é a pureza e a compreensão.

As idéias de que Deus não para de obrar e de que são muitas as Suas moradas, deram base ao pensamento de que o Altíssimo comanda uma majestosa obra que se estende por outros planetas; por esta linha, sólida vertente do espiritismo em coerência ao processo de transformação, explica que um orbe de nome Capela ascendeu à pureza, exilando seus primitivos a ocuparem a Terra, que por sua vez sofre semelhante processo, onde uma linha imaginária divide os homens segundo sua consciência. Enquanto rude e próprio ao sofrimento, classifica o nosso planeta em grau de expiação, forma graciosa de acumular experiências que possibilitam a elevação; porém, ao evoluir tecnologicamente, o homem expurga os martírios nos quais viveram seus antepassados, reclassificando a Terra em grau de regeneração. Neste processo cíclico seres de índoles distintas será separado, tal qual o trigo e o joio, expurgando estes últimos a outros orbes inferiores para cumprir mais uma etapa de evolução.

Porém, tudo do que foi relatado são perspectivas viáveis: o materialismo e o espiritualismo, dividido entre a ressurreição e a reencarnação, são frações de probabilidade; nada é certeza, mas nem tudo é tão misterioso assim que não possa ser elucidado, porque o processo de comunicação com os mortos advém de um tempo ausente da eletricidade, sendo seu efeito obtido por meios que dispensam fios e aparelhos, de um engenho relativamente simples perante o homem do terceiro milênio. Nesse momento os céticos, os científicos e os ilusionistas serão chamados a desmistificar os farsantes, diante das revelações manifestadas pelos desencarnados, já que a sociedade moderna atinge um grau de comunicação e mobilização capaz de colocar em xeque todas as concepções teológicas do planeta.

As variadas culturas invocam deuses a partir de conceitos concebidos na busca da harmonia social, desenhando ritos comuns e conflitantes de suas crenças. Mas hoje vivemos um tempo de desmistificação, pois a árvore do cristianismo floresceu em galhos e ramificações, sendo aceitável o ecumenismo de suas crenças, porém, as religiões elevam mártires e profetas, fazendo o mensageiro mais importante que a mensagem, desclassificando qualquer pretensão a um sincretismo, nivelando a divindade à estirpe dos demais, ofendendo a santidade do Cordeiro. Mas as nações após confrontarem seus exércitos e seus comércios, por fim compararão suas ideologias, para que prevaleça a mais cativante, a mais abrangente, a mais coerente e principalmente a mais próxima da ciência e da verdade, assim como deve ser o verdadeiro Deus.

Religiões diversas aparecerão fundamentadas em livros sagrados a delinear dogmas e comportamentos, que por princípio são unânimes para a harmonia social, mas naquilo que divergem abrem espaço para um confronto teológico. Todas têm o pensamento de estarem certas em sua crença, mas não alcançam a aceitação recíproca de sua convivência pelas variáveis da dominação econômica e de sua fundamentação teológica. Mas os livros não são como espadas que duelamos para sobreviver, e suas ideologias favorecem uma guerra fria com trocas de animosidades, ressaltando o rancor por onde deveria prevalecer o amor.

A literatura espírita que descreve a fenomenologia sobrenatural é mais convincente da existência de forças superiores que qualquer referência teológica, porque estas estiveram resguardadas por um respeitoso temor que as tornaram imaculadas perante a liberdade de crença; a primeira, no entanto, flui devaniosamente se expondo às injúrias e à própria verdade, que só faz por alicerçar-lhe a cada dia. Perante a dúvida uma nova palavra só terá credibilidade mediante provas concretas da ocorrência do sobrenatural, ou então, seria como pensar que homens que não têm os olhos iguais aos nossos, afirmassem haver um Deus, mas que de seu poder apenas mostrassem antigos escritos, desvinculados de fenômenos extraordinários, tais quais relatados em sua fantástica história.

Diante da sobrevivência mercadológica, segmentos do cristianismo por vezes atacaram ao espiritismo e erroneamente o fizeram, porque se torna mais difícil converter fiéis de outras religiões munidos puramente de antigos escritos, do que seria fazê-lo com a presença do sobrenatural. Só existiu uma única gênese e única também será a convicção humana quando a conhecer. Porém, nos dias atuais, apenas um terço da população mundial tem convicção teológica fundamentada no Evangelho, os dois terços restantes crêem em religiões milenares, ou seitas modernas, supostamente não aptas a se converterem por meras palavras, cabendo-lhes uma doutrina que não se atenha a concorrer com as demais, mas a provar a vida na forma espiritual para depois consagrar seu Guia, pois, se capaz de provar a existência do espírito, então a ordem reinante será segundo as palavras D’aquele que falou sobre tal ordem com mais propriedade.

Mesmo o Livro dos Médiuns sem o acontecimento dos fenômenos mediúnicos, seria apenas um livro pueril; no entanto, o espiritismo se atém a fatos mediúnicos, sobrenaturais, inexplicáveis a todos os conceitos, pois a verdade é que os fatos não podem ser adequados às doutrinas, mas as doutrinas é que derivam dos fatos e o que vemos no espiritismo é o resgate de conhecimentos não vivenciados nesta vida. O mundo real fundamentado apenas na palavra escrita não seria suficiente para gerar o sentido de um algo mais, pois as demais religiões também possuem escrituras sagradas e não alcançarão conclusão pela comparação de seus livros. Porém, o espiritismo realça fenômenos para desacreditar, ou ratificar a continuidade do espírito como uma lei biológica, de um mundo espiritual, do qual existindo, sem exceção todos faremos parte.

O exercício de crer sem ver é capaz de incorporar atributos ao homem, em que as forças que movem minúsculas agulhas, cresçam a mover montanhas. Essa semente teria de germinar na terra mais fértil, preparada e desenhada na forma do amor, pois a procura de mensagens de cônjuges falecidos trará viúvas de outras terras, para em seu idioma confrontarem o conteúdo da revelação com a história de vida, gerando diante da exatidão das coincidências, indícios da existência viva do que pareceria morto, mas que se mostra vivo e reacende a esperança.

Assim, o espiritismo traz para si o encargo da fé por resguardar o sobrenatural. Este é seu fim e a isso lhe basta, tudo mais é dado por acréscimo. Porém, como doutrina não tem a imperiosidade de crescer, apenas de existir para que até de longe vejam o mágico clarão que desperta sobre a humanidade. Em se revelando, mostrará mais força pela eternidade que pelos setenta e quatro anos, três meses e nove dias que possa durar uma vida, chamando a todos a unificar suas posições, não lhe restando ser a religião do futuro, mas o futuro das religiões.