A lei da natureza é que tudo se direcione para uma condição mais estável, pois a faca deitada sobre a mesa não se posiciona de ponta, mas é a faca de ponta que tende a se deitar. Embora regido por leis e exemplos mais complexos o universo tem mesmo essa propriedade de se acomodar, de alcançar uma forma mais consistente e estável, enquanto o racional contrariamente cria sistemas abaladiços, menos sólidos, porém, voltados para seu próprio usufruto.
Essas observações transcendem o planeta Terra e hão de reger o grande cosmo em toda sua extensão tridimensional e transdimensional, pois as leis físicas que aqui imperam não apontam nenhum indício de que ocorra de maneira diferente em qualquer lugar do espaço. Nosso pequeno mundinho é cenário para o erguimento do racional a partir dos inanimados minerais, onde organizações evoluíram desde as pequenas tribos às grandes nações, sempre regidas pessoalmente por um líder, ou por um conselho de notáveis, direcionando suas ações em prol do coletivo, que doma os controlados e estes o reconhecem, venerando e aclamando sua autoridade.
Resgatados estes princípios, é possível estender seus fundamentos e enxergar o processo evolutivo da humanidade na Terra como um pequeno laboratório a replicar a vivência do grande cosmo que extrapola as dimensões da matéria e alcança a espiritualidade. Percebemos a interferência social das civilizações se sobrepondo, dos maiores sobre os menores, num ritmo de apoderação que direciona o todo para um equilíbrio de governança entre os variados níveis de seu conjunto. A razoabilidade aponta para um universo de amplo espectro organizacional, de sociedades marcadas por lideranças que se fazem impor conforme gradiente do conhecimento tecnológico e de poder.
Essa é a dinâmica de dominação que a nossa compreensão alcança e qualquer pressuposto deve estar alicerçado na presente plataforma, sob o risco de tornar-se fábula olimpiana, pois a lógica do mundo material não se opõe ao mundo espiritual que se apresenta sob um conflito de forças, já que as principais religiões preceituam a existência de Deus e um opressor. Outras religiões também consideram a dualidade energética do bem e do mal, porém, sem a personificação de deus e de um exército de anjos, tendo em seu lugar as grandes leis cósmicas como determinante da nossa existência.
Dessa forma, nos atentamos ao mundo do além sob a perspectiva de duas concepções distintas: a de personificar sua regência mediante o pressuposto de uma liderança com planos e objetivos próprios, como também a versão despersonificada da liderança suprema que submete o processo de acolhimento e abominação a regras gerais da natureza, ainda que susceptível a parâmetros pessoais como fé e amor, misericórdia e perdão.
Essa última concepção nos remete a conceitos holísticos do grande cosmo, que expõe a Terra a um caldeirão multicultural de tradições sujeitas a choques sociais entre as variadas correntes teológicas. Cada religião pode, ou não, estar sob a regência segmentária de lideranças, mas a universalidade é por si inflexível e indelével, destituindo o protagonismo de qualquer comando individualizado, desapropriando toda divergência conflituosa pela secundariedade de suas graduações perante o todo maior.
O pressuposto é que embora algumas religiões sejam personificadas por profetas surgidos em diferentes regiões e épocas, todas expressam leis da natureza, que reside na interseção de suas doutrinas. Portanto, para não subdividir setorialmente o céu a cada religião, consideremos que suas diretrizes comuns emanam das leis do universo que se apresentaram a cada povo através de mensagens e comandos a homens encarnados, cujas histórias são recheadas por acontecimentos sobrenaturais oriundos da grande ordem cósmica.
A marca crucial desse pressuposto está na impessoalidade que nos acolhe em espírito, tanto em cobrar quanto em perdoar, sugerindo uma equação quase matemática dos acontecimentos porvir, sem distinção por casta, ou carma, imperando apenas as ofensas e os méritos pessoais. Nesta perspectiva existe sim a possibilidade de um sincretismo que converge os muitos caminhos na direção de um nirvana, resultante de um processo de desapego material e apreço espiritual, em que cada qual se entrega a uma experiência transformadora do seu ser, requerendo uma predisposição própria em busca de uma libertação das ansiedades mundanas.
A possibilidade de um sincretismo harmonioso tende a apaziguar os confins da Terra, irmanando os homens pelo clamor de um bem maior. A presunção é de que religiões setoriais convirjam para a regência do universo que quer ver na Terra o reflexo de sua unidade, e assim torna-se seu mensageiro menos importante que sua mensagem, como sempre foi na história antiga quando o emissário, em medida preventiva, era sacrificado após a entrega da informação.
Por outro lado, a concepção personificada é constituída de uma liderança que igualmente permeia as tradições humanas, onde as religiões relatam protagonistas próprios, sobressaltando a onipotência divina de cada cultura, que por conceito não pode ser comum a vários deuses, pois senão deixaria de ser o ápice do poder para ser apenas um grande poder atribuído a várias criaturas. Evoluímos e entendemos que o mundo dos espíritos não pode ser loteado a diversos poderes como foi o Monte Olimpo na Grécia antiga, organizações menos poderosas são controladas por organizações mais poderosas, e o poder tende a se concentrar nas mãos do Ser maior que se manifesta a diferentes épocas e regiões da Terra.
É plausível a existência de um Deus único, personificado e cheio de vontades próprias com capacidade de reverter leis naturais, e como sua feição nos é desconhecida, O idealizamos a nossa imagem e semelhança ante o inverso. Agora a marca crucial está na pessoalidade com que intercede sobre a condução de nossas vidas e mortes, tomadas de predileção e maldição, desconexas da proporcionalidade de atributos e defeitos. As várias religiões contemplam episódios de favores prestados em relação à carne e ao espírito, o próprio Messias do cristianismo perdoou várias vezes os pecados dando passe livre ao espírito, como uma forma de tratamento pessoal e individualizada. De fato, a bondade é gratuita de quem dá como nos ensina a parábola dos operários que recebem o mesmo talento para distintos horários de trabalho, é fruto de decisão pessoal em contraste com a hipótese anterior, marcada pela impessoalidade cósmica, com regras rígidas e universais para todos.
Tal premissa novamente nos remete à possibilidade do sincretismo entre as variadas religiões, pela equivalência de seus profetas emanados do mesmo Deus, como sendo todos homens mortais a transmitir a vontade divina que comumente esboça os ditames da melhor agregação social. E assim, apesar da dualidade na concepção divina, que vai desde a personificação de Deus à existência do espírito como evolução da natureza sem a presença de um líder máximo, ambas as possibilidades subsistem ao alcance do sincretismo, pois todos entendem que o mundo dos espíritos é comum a todos os humanos e não pode ser repartido às diversas facções nacionalistas do nosso planeta.
Portanto, se todas as possíveis formas de comando espiritual nos leva à razoabilidade de um sincretismo entre as diversas correntes teológicas, com mais chances ainda alcançaríamos tal sincretismo ao se falar de religiões irmãs de um mesmo precursor, porque sendo comuns na origem se integram ao mesmo Deus. É o caso das três religiões abraâmicas que se originam de Abraão recebendo orientações diretas do próprio Deus para se abstrair do mundo politeísta e fundar numerosa nação.
Na verdade, a convergência dos preceitos dessas três religiões é estreita, amplas são suas dissonâncias estruturais que alimentam a discórdia de suas vorazes ramificações, concentrando mais de 90% das guerras ocorridas desde o mundo medieval. Dentre as três derivações está o judaísmo, que nasce da migração de um pequeno grupo sem terra vagueando em busca de uma pátria, e sua sina aparentemente instável produziu um esforço de sobrevivência que forjou na cultura de seu povo uma notável capacidade multilingue e também de articulação, vista na produção per capta de patentes e de grandes prêmios científicos atribuídos aos seus descendentes.
Outra derivação é o cristianismo fecundado da combinação dos preceitos messiânicos e da tradição pagã, que obteve adesão maciça da civilização ocidental e se instalou inicialmente na sede romana regendo pessoas e nações. Apesar de enfrentar o grande cisma do oriente, conflitos armados, e a dissidência protestante, é a religião mais numerosa do planeta.
Por fim, o islamismo, a mais tardia das religiões, surge igualmente em oposição politeísta, animado pela militância armada de um povo oprimido que vê em seu jihad forma de ascensão. Sua história de guerra e de dominação se estende aos dias atuais clamando as atrocidades impostas pelos cavaleiros templários, quando na verdade procuraram a guerra ao invadir a Europa no século VIII incitando o desenvolvimento bélico de um continente adormecido.
Representativamente, o judaísmo rememora Moisés como libertador e outros profetas maiores e menores marcados na história de seu povo. O cristianismo aproveita os mesmo profetas do judaísmo e culmina no surgimento messiânico prometido nas palavras de Isaias. Na seqüência cronológica, o islamismo incorpora a todos os anteriores, reclassifica o Messias cristão como profeta e finda no nome de Maomé o período das revelações. Assim, essas três religiões evocam o mesmo Deus sob um culto monoteísta, mas se farpam pelo Seu amor.
Na verdade, a insanidade de alguns precede as virtudes humanas, e interesses escusos denigrem nossa espécie pelo egoísmo que exalam, aproveitando-se da tradição que como gado conduz as pessoas. O homem é predominantemente produto do meio social, e aquele que nasce no mundo islâmico muito provavelmente irá defender valores do seu meio, bem como aquele que nasce no mundo cristão, ou judeu, todos possuem grande chance de se tornar um destes ao assumir suas próprias responsabilidades e preferências. Diante desta transferência quase automática de valores a manutenção de divergências tende a se perpetuar já que suas fundamentações são antagônicas de formação, e a este conflito natural some-se a necessidade comercial armamentista que alimenta ilusões de conquistas e vitórias de onde só há perdedores.
As religiões abraâmicas englobam mais da metade da atual população mundial, envolvendo-as em conflitos que emanam de suas divergências estruturais. O judaísmo preceitua o acolhimento ao estrangeiro, o cristianismo ensina estender a outra face àquele que lhe esbofeteia, prega a paz e o perdão porque somos todos pecadores e precisamos da misericórdia de Deus, enquanto o islamismo sugere matar os exploradores estrangeiros classificando-os de infiéis, então cabe a cada qual optar por quais crenças lhes é mais pertinente à sua personalidade, e assim vencer o efeito “manada” que nos conduz ao abatedouro.
Agora, independente da crença pessoal, somos todos chamados à congregação dos povos, porque o mundo cansado de guerras quer ver na personalidade de seus líderes ânimo capaz de superar suas diferenças ao adorar o mesmo Deus. Se fordes ateus, em nenhum deus acreditais e nada crês após a morte corporal, então essa confusão teológica se perde de sentido, são bobagens da crença dos homens que se matam por estupidez. Se creres em uma lei cósmica que nos acolhe após a morte, que governa todo o universo e nos estende sua consciência por diversas formas nas variadas culturas humanas, novamente enxergais essa confusão teológica como extravagâncias das civilizações que guerreiam por ideologias de um mesmo princípio. De outro modo, se acreditais que o Deus soberano de todo universo se revela de maneira direcionada por meio de seus profetas, mas é o mesmo Deus de cada povo que distintamente elege seus emissários para Se revelar, entendeis que esse Deus não pode ser consagrado pela bestialidade das guerras santas.
Porém, se tens tua fé atrelada a um nome na história humana, cujo profeta possui a verdade infalível do verdadeiro Deus em que depositas tua crença, O defenderás perante as guerras religiosas e classificarás os demais deuses em disputa, e entrareis no covil dos leões para morrer em Seu nome. Mas não pode haver pátria nem regionalização no mundo espiritual, é das incongruências religiosas que brota a distinção de deuses, alimentando naturalmente a discórdia. A origem das dissonâncias religiosas está na consagração do emissário que distingue o deus de cada povo, como se anunciassem distintos deuses, porque se o verdadeiro Deus fosse visto e venerado como um poder soberano, seus profetas seriam menores que o próprio Deus, e o povo das nações idólatras convergiriam sua adoração na irmandade do único Deus.
Até aqui coube ressaltar a insanidade das guerras santas, pela racionalidade de um único Deus se sobrepor a insensatez de um loteamento das almas no céu, mas cada derivação abraâmica exalta o personagem terreno de sua criação causando a discórdia de suas comparações. O judaísmo retumba o nome de seus patriarcas Abraão, Isaac, Jacó e também Moisés como pilares de sua eugenia que seguirá na espera milenar de um novo messias. O islamismo de Maomé é a apropriação dos patriarcas e profetas das outras correntes com ranço de vingança, proclamam-se pacíficos, mas acobertam conterrâneos jihadistas. Por fim, o cristianismo nos remete ao dogma de Santo Atanásio que consagrou divindade ao Messias, contrário ao pensamento ariano, uma corrente sufocada que O concebe como homem, assim como os demais profetas judaicos e muçulmanos.
A corrente ariana nega a consubstancialidade entre Deus e a pessoa do messias, embora aceite a primogenitura de sua criação. É uma forte guinada ao monoteísmo, entendendo como idolatria toda adoração não dedicada a Deus. Mas o diferencial está em Constantino e nos bispos do concílio de Nicéia que acataram a argumentação de Atanásio e prevaleceu o entendimento da Santíssima Trindade, conferindo condição única e incomparável ao Messias, que não o vê apenas como protagonista do cristianismo, mas como o próprio Deus encarnado. Essa significativa diferença distingue o cristianismo trino de todas as religiões do planeta, pois já não é a mensagem crucial e o mensageiro dispensável, a presunção dogmática é de um Deus que se faz anunciar.
Não sabemos o grau de adulteração que os interesses dogmáticos alcançaram, e a opção da dúvida não nos pode ser negada, por isso é necessário rever toda discussão de todos os concílios. Somente pela leitura de todos os documentos guardados na biblioteca do Vaticano poderemos avaliar a intromissão dos interesses mundanos sobre a verdade do verdadeiro Deus, porque como já dito “nada há de oculto que não venha a ser revelado, e nada em segredo que não seja trazido à luz do dia”. Para ser fiel à verdade o Vaticano deve escanear cada página de sua biblioteca e disponibilizá-la ao mundo para que estudiosos como Giordano Bruno possam renascer, não para vingar sua morte na fogueira da inquisição, mas para clarear os dias confusos que incitam a desordem. A verdade e o conhecimento devem somar contributivamente à vontade do Eterno, e a mentira e o encobrimento só alimentam as trevas.
Aqueles que atribuem uma condição humana ao messias estão livres em sua coerência para gritar a paz no mundo e professar um sincretismo entre as várias religiões, pois nivela sua crença com as demais, retirando do messias a condição divina, igualando o Deus cristão ao Deus judaico e ao Deus muçulmano. No entanto, o pressuposto da divindade messiânica impõe a imiscibilidade do cristianismo com as demais religiões preconizadas por homens, pois na primeira é o próprio Deus que nos fala, enquanto nas demais são homens expondo suas visões pessoais. Desta forma, o sincretismo é um desrespeito ao Deus encarnado, é a nivelação do Santo ao profeta, é a equivalência do sacro ao profano, é a paridade do celeste ao mundano.
O evangelho messiânico prega o caminho até Deus e que ninguém vai ao Pai senão por Seu intermédio, e Sua vinda foi profetizada como Aquele que viu o rosto de Deus e por isso fala das coisas de Deus com propriedade incomparável. Querer assentar em uma mesma mesa, homens representantes de religiões diversas é mais que outorgar equidade de autoridade entre as cadeiras, é desprezar todo sofrimento exposto na cruz, e exatamente por isso é justificada uma dor tão desproporcional, para fundamentar que somente Ele é capaz de fazer o que fez, e qualquer outra anunciação é pérfida e espúria.
Dessa forma, o sincretismo é válido entre as religiões fundadas por homens, onde todos falam de um mesmo comando que devem congregar-se. Mas aquele que faz o sinal da cruz não se misture a essa gente que não releva o Santíssimo, porque Ele mesmo disse que não veio trazer a paz, e também que não vos perturbeis com rumores de guerra porque assim deve acontecer.
Dentro do cristianismo trino se admite coerência no ecumenismo, já que nunca foi visto da figueira nascer o figo e o abacate, porque são exclusivos de cada árvore que tem fundamento em sua semente. Mas a teimosia da concupiscência humana não se restringe apenas a matéria, e pretensiosamente alcança patentes espirituais, onde cada religião derivada tem a premissa de reconhecer ao Santíssimo como caminho único a Deus, e se eles não são contra nós, são por nós, então paciência.
A minoria engajada controla a maioria dispersa, pois há uma sólida recompensa que motiva e fortalece a ação de poucos sobre a generalidade, e por essa razão o mal é triunfante nas empreitadas em que acuam os pobres, os humildes, os desarticulados. Já as virtudes da esperança, da solidariedade e da irmandade não se engajam por si apenas, foi necessária a presença de um idealizador para que tais benesses surgissem no seio da humanidade em contraposição ao egoísmo de poucos. E embora seja esse um processo milenar haverá o dia em que o lobo viverá com o cordeiro, o leopardo se deitará com o bezerro, o leão e o novilho gordo pastarão juntos. A vaca se alimentará com o urso e o leão comerá palha como o boi. A criancinha brincará perto do esconderijo da cobra e colocará a mão no ninho da víbora. Ninguém fará nenhum mal, nem destruirá coisa alguma, pois a terra se encherá do conhecimento do Senhor.
Talvez o livro da Gênese tenha suprimido um diálogo de Deus com Abraão no momento em que estava para sacrificar a Isaac, quando teria dito:
- Eu não matarei seu filho, mas seus descendentes matarão o Meu!
Não que a morte seja fim, mas é renovação, ou do contrário, a civilização suméria ainda governaria a Terra. Por isso, Deus prometeu enviar o Messias, que falará de coisas tão sublimes que até o mais sábio aprenderá, e as falará de forma tão clara que até o menos sábio as entenderá.