Tanto a experiência de Urey-Miller quanto a transposição interestelar são conceitos fundamentais para qualquer consideração sobre a origem da vida em nosso planeta. A experiência de Urey-Miller não se encontra plenamente consumada, pois ainda não existe um teste laboratorial capaz de gerar a vida com capacidade reprodutiva, apta a alcançar uma segunda geração consolidando sua faculdade multiplicadora. Até o presente momento é concreto a Propriedade Evolutiva da Matéria (PEM) pela transformação do inorgânico inanimado em proteínas orgânicas primárias, mas somente conhecendo seu alcance total é possível abrir porta para o entendimento da existência viva.
A mensuração do alcance da PEM interfere no entendimento de um Deus criador, que se sobrepõe a presença de deuses astronautas colonizadores, já que esta última versão não esgota o entendimento sobre a origem da vida, mas apenas transfere para outro sistema solar o enigma de sua criação. Então volveríamos a questionar se em tal estrela de origem a vida também não teria sido germinada por seres oriundos de um terceiro sistema solar, e a partir de então se cria um efeito dominó de transferência de causas e substituição de efeitos, sem nunca alcançar o acontecimento primário da vida em algum planeta do universo.
A realização de um experimento dando validade à plenitude da PEM, como capaz de alcançar a auto-sustentação reprodutiva, descartaria totalmente a atuação divina em nosso processo embrionário, já que não parece lógico priorizar uma força intangível diante de processos laboratorialmente comprovados. Tal experimento não alcança necessariamente Sua extirpação, pois prioritariamente Deus nos ocupa pela possibilidade de uma pós vida espiritual, independente de nossa origem carnal. Por outro lado, se for possível comprovar limites a PEM, como incapaz de alcançar novas gerações, ressurge a imposição de um estímulo excepcional à formação da vida, neste ou em outro planeta do universo, reacendendo a necessidade de uma força criadora.
A comprovação do alcance pleno da PEM nos leva a pensar na espontaneidade da vida pelas galáxias do universo, cabendo a cada orbe uma fração de probabilidade para alcançar condições essenciais à ascensão intelectual, e diante das inúmeras ofertas planetárias o evento ocorreria entre um e outro sistema solar pulverizadamente. A reunião dessas condições sucederia ora aqui, ora ali, segundo uma distribuição não constante, mas oscilante em relação ao momento de seu afloramento, antecipando a evolução das civilizações primárias, conseqüentemente dotadas de um maior conhecimento tecnológico comparativamente às demais.
Seguindo no entendimento do alcance pleno da PEM e considerando a variação temporal no desenvolvimento das galáxias, o mais coerente seria supor nossa posição tecnológica como intermediária, e questionável seria assumir qualquer outra pretensão. A longevidade do universo permite vislumbrar a sucessão da vida entre milhares a milhões de anos anteriores, o que possibilita pensar que as civilizações inaugurais desfrutem de tecnologia inalcançável a nossa compreensão, tornando a transposição interestelar uma realidade na colonização de planetas diversos, entre os quais a Terra estaria inclusa.
Mas antes de tudo, a transposição interestelar é apenas uma possibilidade, pela incerteza de que a tecnologia do futuro alcançará viagens a outras estrelas simplesmente porque barreiras históricas do passado foram quebradas. Não podemos admitir a ausência de limites às conquistas humanas, pois são incomparáveis as dificuldades de se locomover entre as estrelas com a capacidade de voar, ou o alcance da lua. De sorte que o Paradoxo de Fermi sobre o grande silêncio extraterrestre será respondido se conhecermos o alcance da PEM e a possibilidade de transposição interestelar, pois o entrelaçamento dessas questões implica em desdobramento irrefutável de sua lógica.
Para entender o desafio de uma tecnologia capaz de realizar uma viagem interestelar seria preciso conhecer as dimensões do universo, e então supor o Sol como uma bola de futebol no centro do campo, em que a Terra a orbitaria como um pequeno grão de areia próximo a meia lua. A luz sairia da bola em câmara lenta e levaria oito minutos e vinte segundos para alcançar o grão. Nessa escala, Próxima Centauri, a estrela mais próxima do nosso Sol, brilharia num campo de futebol do outro lado do Atlântico a quatro anos luz e a Via Láctea inteira com mil séculos luz de extensão seriam bolas brilhantes ocupando o espaço equivalente da Terra até o verdadeiro Sol. Essa visão do universo pode tornar-se mais distante, ou mais intrigante, quando se concebe que outras galáxias vagam o espaço sideral, como nossa vizinha Andrômeda, a uma distância em que a luz viajaria por vinte e cinco mil séculos, pairando nessa mesma proporção próximo a órbita de Plutão.
A amplidão do universo tem dimensões desproporcionais com as quais lidamos e nos separam numa relação que pode estar bem mais distante da que guardamos comparada à época em que se quis construir uma torre para alcançar a Lua, pois pelo princípio convencional dos foguetes estamos aprisionados ao nosso sistema solar, não sendo possível alcançar outras estrelas, dado aos efeitos relativísticos que impedem a aproximação da velocidade da luz pela elevação da massa, inviabilizando energia de aceleração. De tal sorte que, a transposição de uma distância interestelar, se for possível, estará lastreada a uma tecnologia totalmente inédita em relação à propulsão de turbinas; algo comparado ao conhecimento antes e depois da eletricidade, já que não viveríamos esse tempo moderno se as cargas elétricas não se fizessem notar pelo raio, e ainda jogaríamos boliche de pedra lascada em homenagem a Benjamim Franklin.
Subsistem dúvidas sobre a possibilidade da tecnologia de transposição interestelar ser alcançável, porém, se a lei da relatividade se mostrar intransponível, cada mundo viverá isolado no confinamento da matéria, cabendo transposição, talvez, apenas para aquilo que não seja matéria. Antes do nascimento de uma idéia ela tem de naturalmente parecer absurda, pois do contrário seria comum a todos os homens, e perseguir clarões na tempestade de fato parece estranho, mas foi a centelha que abriu um imenso leque de possibilidades. Assim como o raio trouxe o fogo, que teve sua importância como elemento que permitiu o homem evoluir até os idos da Idade Média, novamente o raio deu ao homem a eletricidade, como elemento chave para a criação de sofisticadas máquinas que representam nossa atual tecnologia, e se ao chão de uma árvore se colhe dois frutos, esperemos um pouco mais, que o terceiro já está por cair.
Fenômenos físicos imperceptíveis aos nossos sentidos certamente existem e estão para serem desvendados pela ciência, pois ainda estamos longe do limiar do conhecimento do universo. Nossa história foi contada dentro do limite de entendimento de cada época e o homem moldou o mundo conforme sua percepção e esbarrou em leis da natureza inalcançáveis aos seus sentidos. O heliocentrismo não foi notado pela lentidão da rotação da Terra, levando a humanidade a um equívoco estático, até observarem o movimento dos astros e assumirem uma nova realidade. Distorção semelhante ocorre com as dimensões: se não fosse a relatividade tudo seria como parece ser, mas o que vemos e percebemos não é do jeito como realmente é, pois existencialmente somos dotados da percepção da matéria em suas três dimensões e mais uma quarta dimensão temporal, sendo estas as potencialidades de que dispomos para perceber o cosmo.
Ainda não evoluímos para entender as leis que regem a própria matéria, pois parece confuso quando se interpreta a matemática de Einstein que prova inequivocamente ser a luz o limite da velocidade no universo. Tal conceito desafia a nossa compreensão, pois entendemos a velocidade relativa de dois carros em sentidos opostos como a soma de suas velocidades, porém, um raio de luz em relação a outro raio contrário, suas velocidades não se somam. A Teoria da Relatividade desenvolvida por Einstein leva a interação tempo-espaço que é laboratorialmente comprovada pelo experimento de dois relógios atômicos posicionados na base e no topo de uma montanha respectivamente, onde a parte mais alta tem velocidade linear maior em razão da rotação da Terra. A diferença entre os raios de posicionamento de cada relógio é de ordem milesimal, refletindo igualmente em suas velocidades de deslocamento, mas que ao longo dos dias seria suficiente para provocar uma distorção minúscula entre o tempo decorrido pelos dois relógios. A mesma teoria também foi lastro para o desenvolvimento posterior da bomba atômica, dando alcance a compreensão de que massa e energia se relacionam através da conhecida fórmula onde E = mc2.
Após a grande contribuição da Teoria da Relatividade, o sonho de Einstein tornou-se unificar duas teorias dissonantes, a quântica e a mecânica clássica, descrevendo em uma única equação o comportamento da matéria, do espaço e do tempo em toda sua extensão. Mas a descrição matemática de tal modelo só foi concluída na segunda metade do século passado após contribuições parceladas de uma dúzia de cientistas, sendo alcançado a Teoria das Cordas, Teoria M, ou Teoria de Tudo, que se traduz na suposição de um universo múltiplo com onze dimensões (10 espaciais e 1 temporal) onde as quatro forças fundamentais (gravitacional, eletromagnética, nuclear fraca e nuclear forte) encontram equilíbrio.
A comprovação laboratorial de tais teorias ainda não foi alcançada, mas esperamos valiosos subsídios do Grande Colisor de Partículas; por hora, nos valemos respaldar que a Teoria das Cordas possui lastro matemático na Teoria da Relatividade que se mostrou irrefutável pela distorção temporal comprovada pelos relógios atômicos, ou pelas imemoráveis explosões nucleares. Com razoável certeza podemos vislumbrar a existência de outras dimensões espaciais além das três que percebemos, inclusive sendo uma delas caracterizada pela eqüidistância dos pontos, ou seja, por onde a distância entre dois pontos é sempre a mesma, permitindo imaginar um canal de transposição (buraco da minhoca) pelo mesmo princípio físico com que pares de partículas subatômicas spin possam interagir seu sentido de rotação instantaneamente, não se sujeitando às limitações do espaço e da matéria.
Portanto, a Teoria das Cordas possui sólida base matemática derivada das equações relativísticas evidenciando locais além da matéria tridimensional, e se nessas sete dimensões intangíveis aos nossos sentidos pudermos detectar alguma forma de energia, então podemos cogitar que nossa energia pessoal possa ser restaurada após a morte corporal para re-existir em novas dimensões. Não é seguro dizer que tais dimensões extraordinárias se correlacionem intrinsecamente com as dimensões espirituais, mas é relevante o registro de que os homens da Era pós-atômica cogitam a existência de lugares insondáveis, em contrapartida aos bravos homens de fé da Era pré-atômica, que em Deus acreditavam, sem nem imaginar onde seria a Sua morada. Esse foi um marco na fé humana, pois anteriormente, havia uma crença no espírito sem uma base científica que ratificasse sua coerência, mas a partir dessas observações, surge um conceito racional da existência de lugares no espaço que nem somos capazes de imaginar.
Nesse tempero de dúvidas e suposições, haveremos de distinguir a fé dos homens segundo a influência cultural do conhecimento tecnológico de seu tempo. O homem atual é munido de informações que validam existência de dimensões paralelas indicando haver algo além do mundo tridimensional. Já o homem pré-atômico é pretensioso, por imaginar conhecer a totalidade do sistema planetário e a extensão do universo limitado às três dimensões da matéria. Por fim, primitiva era a visão anterior a expansão mercantilista, de quando o homem entendia a Terra como plana e geocêntrica, em que a ocorrência do sobrenatural estava necessariamente vinculada com a existência de deuses e de uma vida em espírito.
É preciso lembrar que nossa concepção teológica está alicerçada em registros antigos, de uma época em que o homem associava os fenômenos sobrenaturais aos espíritos e à vida do além. Todo episódio que transcendeu a compreensão humana teve sua causa motriz imputada a vontade divina, no entanto, diante da possibilidade de sermos fruto da colonização de uma civilização evoluída, tais fenômenos sobrenaturais passam a ter a perspectiva de uma segunda fonte de origem para sua ocorrência. E a perspectiva de uma segunda força capaz de produzir o sobrenatural não invalida a premissa espiritual, pois mesmo que se possa justificar o inexplicável como ilusão de uma civilização superior, a partir da Teoria das Cordas há de se considerar a existência de dimensões inimagináveis, impedindo-nos de qualquer conclusão definitiva quanto ao porvir do colapso corpóreo.
Utopicamente para uns e realisticamente para outros, interessa-nos a sobrevivência de nossa consciência reunida às de nossos amigos, familiares e congêneres. Não haveremos de re-existir como uma pedra, inerte e sem vida, mas em alguma forma de energia resgatável que certamente não está ao alcance de nossos sentidos, mas que possa pairar nas dimensões do universo cogitável, similar, ou análogo ao descrito pela Teoria das Cordas. Portanto, se a espontaneidade plena da vida fosse comprovada, poder-se-ia desprezar o processo criacional divino, pois a razão tangível suprime a concepção etérea, mas não alcança descartar Sua existência e do mundo espiritual, pois a mesma ciência que desvenda a PEM corrobora a existência de dimensões extraordinárias que possa acomodar nossa consciência pós-morte. Se nada conhecemos sobre tais dimensões, cabe minimamente prudência em nossas reflexões antes de querermos nos igualar a inteligência do próprio Deus.
Pareceria que a ciência nos ludibria, pois ao mesmo tempo em que nos dá perspectiva do florescimento espontâneo da vida, dispensando o criacionismo divino, essa mesma ciência nos aventa a existência de dimensões extraordinárias à matéria, supostamente versada nos registros teológicos, reacendendo a existência divina e toda uma estrutura celestial capaz de nos abrigar em espírito. Ao homem pós-atômico nada parece ser conclusivo, a dúvida persiste e após milhares de anos de formação cultural, talvez possamos compreender o significado de que ninguém poderá ver o rosto de Deus senão morrer, pois apenas a morte pode levar ao espírito, e só vivendo em espírito é possível concluir de Sua existência. Portanto, a presente obra premia a incerteza e repudia todo absolutismo; e tanto o ateu materialista, quanto o crente espiritualista, estarão em desacordo com a ciência ao imporem suas convicções, porque a partir da era nuclear as duas versões têm respaldo científico, e se nenhuma delas apresenta incoerência que a descarte, não temos como saber qual delas é a verdadeira.
Ainda vivemos o amadurecimento necessário para absorver a sobreposição destes conceitos, pois embora se admita o sobrenatural como real e verdadeiro, questiona-se a origem destas forças que tanto podem advir do plano espiritual, como das três dimensões da matéria. No passado não subsistia dúvida porque só havia uma única hipótese espiritual, mas hoje, entendemos que o sobrenatural também pode derivar da matéria tridimensional que coloniza a Terra, oferecendo-nos duas alternativas coerentes com a ciência pós-atômica. O dualismo aborda o pensamento crucial de nossa história, a sobrevivência pós-morte corpórea, onde duas fundamentações possuem embasamento científico para explicar o sobrenatural de nossa vivência. É justamente nessa dualidade que se funda a fé, pois enquanto não atingirmos um maior conhecimento que permita descartar a uma das hipóteses, ambas permanecerão vivas e válidas, reacendendo o elemento incerteza, imprescindível para que possa haver a fé; pois que diante de uma determinação científica a crença dá lugar à lógica, desaparece a fé para surgir a razão em seu lugar.
O apogeu do iluminismo deu ao homem uma grande sensação de poder, parecendo razoável pensar que o materialismo fosse capaz de explicar todos os acontecimentos relatados na história humana sem o expediente de elementos invisíveis e intangíveis à nossa realidade. Mas a partir da Era pós-atômica e lastreada numa avançada matemática, pôde o homem deduzir que o universo seria instável e sucumbiria se tudo se resumisse as três dimensões que conseguimos ver e tatear. A partir de minuciosos cálculos do equilíbrio das quatro forças fundamentais pode a ciência moderna detectar que o universo que conhecemos subsiste num contrapeso de fina precisão, em que a diferença de velocidades entre as galáxias indicam sua expansão num tênue equilíbrio, já que se sua dilatação fosse uma minúscula parte mais rápida, toda a matéria do universo estaria irreparavelmente dispersa, e da mesma forma se tivesse sido uma ínfima parte mais lenta, a atração das massas já teria revertido seu movimento para uma retração no sentido inverso do big bang.
A precisão do equilíbrio dessas forças pode alimentar a necessidade emocional de um criador, mas a história já nos mostrou que não devemos ter a presunção de um Criador por aquilo que não entendemos. Na verdade não podemos limitar o que é infinito, pois nada sabemos de como tais forças operavam antes da existência do próprio universo, e pela extensão do infinito, o universo pode ter existido com outras proporções destas forças, sem havê-las suportado e conseqüentemente sucumbido, levando a natureza a uma nova tentativa de equilíbrio até alcançar o momento em que hoje vivemos. A natureza reflete apenas o equilíbrio do que sobreviveu e não a própria perfeição; tudo que é frágil sucumbiu e não existe mais, e tudo que existe não tem a necessidade de ser perfeito, mas apenas de suportar os trancos das Eras.