Já não habitamos a Terra em longínquos povoados cujas caminhadas eram contadas em dias, os sinais de um novo tempo estão na rede virtual, que assenta a todos numa mesma mesa, bem como na conurbação das cidades que se juntam e se engolem. Esse fato em especial faz perceber que a extensão territorial do planeta chegou ao seu limite e finalmente torna-se razoável cogitar que em breve as estradas, pontes, prédios e palácios estarão todos construídos dispensando o trabalho árduo em suas fundações e escavações.
Será um tempo em que toda infraestrutura de nossa subsistência estará estabelecida, restando ao homem umas poucas tarefas recorrentes e seus esforços estarão voltados a obras de genialidade. Talvez nessa época, menos de um por cento da população se atenha aos processos produtivos repetitivos, viabilizando elevado salário pelo menor contingente braçal necessitado; de modo que toda utopia marxista será alcançada pelo seu opositor, que invertendo a interpretação dos ganhos de produtividade, possibilita a transformação do antigo proletário explorado em cidadão.
A relação entre o capital e trabalho sempre foi de favorecer o primeiro pela desproporção entre suas ofertas, pois o desprendimento de grandes esforços pela sobrevivência foi uma constante nas civilizações, cujos processos produtivos embrionários alijaram a população trabalhadora de seu usufrutuo. Somente após a extensa acumulação de capital é que pode a classe marginal participar do grande banquete capitalista, e hoje sabemos a função da miséria na sociedade e o tempo que lhe resta até que o mundo esteja pronto e construído; depois deste estágio a necessidade servil se minimizará, tornando-se alcançável um padrão de justiça e dignidade a todos os humanos.
Paralelamente avançamos no reconhecimento de um regimento único sobre o planeta, pela visão de que os esforços para se atingir grandes conquistas são demasiados para as nações isoladas, que se agruparão em centros de estudos, em uma mesma moeda, em um mesmo idioma, para todo o restante ser dialeto; pois o capital se internacionalizou derrubando barreiras e os povos se miscigenaram para confrontar suas ideias até que prevaleça a razão pelo destilar das concepções humanas.
Se houvessem outras Américas a conquistar haveríamos de crescer e nos multiplicar, mas somos a geração marcante da transição dos tempos, de uma mentalidade em que o potencial intelectual humano seja valorizado e direcionado para o engrandecimento do conhecimento; se não for essa nossa bandeira, poucas serão as chances de perpetuarmo-nos além dos ultrapassados dinossauros. Hoje o planeta tem suas dimensões esgotadas e a última fronteira para a nova ordem é a construção física de suas últimas pontes, estradas e de todos os caminhos que nos levam a esse tempo. É o estabelecimento de uma infraestrutura que retire do homem o esforço braçal para se dedicar ao acúmulo do conhecimento.
Houve no passado uma mentalidade de valorização científica, porém o conhecimento adquirido raramente se traduzia num ganho imediato de poder, capaz de garantir longevidade aos seus reinos; os recursos voltados para a ciência e às artes desfalcariam seus exércitos que sucumbiriam, estancando de vez a árvore da civilização. Mas após milhares de anos de guerras e de suas invenções bélicas, a ciência já nos ensinou a extrair energia da matéria e a alcançar a Lua, e também nos proporcionou o conhecimento social que aqui se desfruta, aventando que a exploração de classes está por cumprir seu tempo de construção da infraestrutura do planeta e que um novo tempo de sinergia está por nascer.
Porém, as mudanças caminham com várias pernas, tendo todas elas que andar para que o corpo avance. Antes algumas das pernas ainda têm de completar seu movimento para que se possa estabelecer uma nova ordem segundo o qual todo indivíduo tenha garantia do Estado quanto à sua dignidade e justiça, modelo este que traria um alto custo social à administração coletiva passada, inviabilizando a acumulação de riquezas e o ensejo da vontade humana de evoluir e prosperar.
Tanto o sangue amargo esvaído nas guerras, quanto o suor sagrado derramado nos campos de lavoura e no chão de fábrica subsidiaram a harmonia das classes sociais. Até então, o fim justificava os meios para que a elite empreendedora cumprisse seu papel na história de nossa evolução, mas a partir do término da construção da infraestrutura do planeta a discrepância social deixa de ter sua importância alavancadora, e passa a ser vista como engodo da malignidade humana que a verdadeira democracia, nascida em berço republicano, sempre almejou extinguir.
Muitas dores se somaram até o alcance da atual tecnologia, mas atingiremos uma produtividade que mesmo sem ferir a legítima reprodução do capital, a divisão da parte restante equacionará um quociente garantindo dignidade a todo ser vivente, pois o avanço tecnológico é a inversão da pirâmide social, onde uma grande elite seja sustentada por uma pequena parcela operária, executora das tarefas repetitivas, mas usufruidora das mesmas benesses.
Nesse tempo de fartura e extrema riqueza, não soará com tanta hipocrisia o bem comum e haveremos de valorizar a vida, articulando-nos para a garantia do bem estar geral. Para tanto, fundamental é o equilíbrio entre a demanda global e a capacidade renovável do planeta no suprimento de insumos, cuja escassez detonaria o preço de seus derivados, reacendendo a desigualdade social.
Mas por ora, a população crescente demanda recursos, trabalho e dignidade, além da capacidade que o atual sistema econômico alcança, e esse crescimento faz aumentar continuamente as desigualdades entre ricos e pobres, visto que as elites seguem usufruindo dos avanços da ciência, galgando patamares cada vez mais elevados, enquanto os miseráveis e analfabetos do passado continuam a existir na base da pirâmide social que permanece imutável. Esse aumento do contraste social será demarcado por rebeliões ideologicamente disfarçadas, trazendo-nos saudades do tempo em que se lutava uma guerra onde os opositores estavam definidos.
A população crescente não demanda apenas comida, mas toda uma infraestrutura urbana de moradias, escolas, hospitais, supermercados, ruas, energia, enfim, uma sequência de obras que requerem um enorme esforço braçal em sua construção. Tais obras possuem uma lógica financeira que passa pelo crivo de uma viabilidade econômica que só se justifica por um controle de salários de custo opressor, indicando que ainda vai levar um tempo para que a nova ordem aconteça.
Todas as instituições que defenderam a proliferação humana exerceram sua influência na multiplicação populacional, propiciando a formação de uma classe trabalhadora que construiu e segue construindo a infraestrutura de nosso planeta. Tal direcionamento foi imprescindível para a viabilidade econômica dos mercados, do comércio e do desenvolvimento da tecnologia, porque se o planejamento familiar fosse ouvido a voz de Malthus*, o homem não teria ainda alcançado a lua, e com sorte o mundo estagnaria numa mesmice ideológica, pela falta da força humana para construir as novas cidades. Porém, hoje sabemos quantos portos, pontes e prédios restam a construir até que toda obra da Terra se realize, e quando aí alcançarmos, o sofrimento e toda miséria que financiaram as grandes obras terão se acabado; esse é o tempo que ainda falta cumprir. *Thomas Robert Malthus, inglês, 1766 – 1834
Herdamos a Terra bruta e quando sua construção se completar equacionaremos a extinção da miséria pelo controle da natalidade, igualando a população mundial com a capacidade renovável de recursos do planeta. Porém, tal entendimento foi entregue a fiéis guardiões que o ocultaram até que a construção do mundo se completasse, de tal sorte que se o processo de controle da natalidade se iniciasse nos séculos passados, sua ocorrência alteraria a relação de oferta entre capital e trabalho na direção do pleno emprego, elevando os salários, inviabilizando a execução de muitos projetos, bem como o processo de acúmulo de recursos para financiar novos investimentos.
Mas a mudança das eras decorre necessariamente de uma transformação de valores, de magnitude tal a inverter o certo pelo errado, ou o bem pelo mal, em que a verdade pura seria de um grande constrangimento que impediria de se falar abertamente, pela falta de compreensão das épocas. Hoje, no entanto, compreendemos que reside na exploração social a origem do subsídio que permitiu a construção do mundo, e somente a partir desta compreensão podemos reformular leis econômicas a se modificarem no sentido de harmonizar capital e trabalho, porque não mais comporta que um fira ao outro.
A Terra atingiu a iminência do seu apogeu demográfico, e hoje se encontra em rota de colisão contra a harmonia social. O planeta é o aquário e nós somos os peixes que temos nossas relações afetadas pela superpopulação; assim como os peixes de aquário desenvolvem o canibalismo sob condições extremas, nossas atitudes escandalosas se desenvolverão pela compressão populacional. Somos de fato a geração marcante da transição dos tempos, porque a extensão territorial do planeta se esgotou, não existem novas Américas a se descobrir e assistimos a conurbação das cidades. Estas são as marcas que nos assegura crer que o tempo de transição começa agora. Nosso desafio será amenizar o amontoamento dos homens, para que num canto da Terra surja uma terra prometida, capaz de abrigar todos os povos com dignidade.
De certa forma o contingente populacional já era estudado no século XVIII, quando foi previsto que cresceria em progressão geométrica, enquanto a produção de alimentos cresceria em progressão aritmética; a falta de anticonceptivos corroborou para sua veracidade, que decaiu na sociedade moderna, com sua disponibilidade comercial e assistencial. Tal transformação poderia ser vista sob a ótica de uma trama secular, passando pela revolução agrícola e industrial que possibilitou as economias de mercado e sua evolução tecnológica, pelos valores da sociedade vibrante do pós-guerra que a tudo se permitiu, e também por variáveis inusitadas como o advento da AIDS que rompeu tabus pela força da vida. Estas são as surpresas que Malthus não vislumbrara como alternativa estratégica da espécie humana, pois a mão invisível do mercado regulou a oferta de alimentos com a população global, onde alguns povos sinalizaram com taxas de natalidade negativas pela reação de suas células sociais que se precaveram de concepções aleatórias e irresponsáveis.
Tudo passa pelo amadurecimento cultural dos povos, pela cobrança da paternidade que traz limites ao furor sexual e forma um sentimento de responsabilidade de nossa criação. O experimento do planejamento familiar no nível médio de dois filhos por casal possui o sentido de que cada um dos cônjuges estaria se repondo na vida, e leva a uma redução gradual na população global pela não reposição daqueles que não formaram prole. Tal fenômeno no decorrer das gerações modifica a relação capital / trabalho, sendo seguida de súbita valorização pela redução na disponibilidade servil, criando um estado pleno de riqueza e prosperidade.
Na medida em que ocorre uma redução planejada da população, surge como resposta uma diminuição da demanda global que gera o sucateamento dos processos de menor produtividade, abastecendo-se primeiramente onde houver maior rentabilidade e abundância. O encolhimento da população e da demanda global impele para a desativação de velhas fábricas, de escassas minas e de terras áridas, todos com alto custo de produção e extração, restando prioritariamente os meios de custo mais baixo.
Cosmopolitamente, seria como imaginar uma cidade que reduzisse pela metade seus habitantes. Além de dispensar o esforço de ampliação para abrigar novos residentes, reverteria também num ganho social o desuso das habitações menos servis referente à população diminuída, pois as pessoas se abrigariam na parte mais útil da cidade, e pela tendência urbanística moderna, reconstruiria a parte em desuso, até que sua obra se completasse.
A redução nos custos de produção e a redução planejada da população global extinguirão a parte inferior da pirâmide social, pois embora o fenômeno se distribua por todas as camadas, pontos superiores serão agilmente completados pela ascensão social.
Os povos que não resistirem ao crescimento vegetativo serão focos de pobreza. Sua população desprovida de controles se alastrará e necessariamente os Estados se protegerão com barreiras de migração, para impedir que outras raças venham pelas camadas inferiores e se apossem de suas sociedades. Viveremos o paradoxo, em que o capital venceu as fronteiras para fluir livremente, enquanto barreiras se elevarão para deter o trânsito de pessoas.
A redução planejada da população vem pela conscientização da sociedade e operada pelos médicos obstetras na laqueadura a partir do segundo filho. As gerações seguintes receberão os imigrantes em busca de oportunidades não preenchidas, possibilitando realizar a miscigenação entre os povos pela limitação da reposição de dois filhos por casal de uma mesma raça, contrapondo uma liberdade de proliferação para os cônjuges de raças distintas, como forma de incentivo a miscigenação. Após gerações a proporção de pessoas de raça pura diminuirá em relação aos mestiços, que se verá de nacionalidade indefinida e consequentemente mais apto a abolir o conceito de nação e pátria para se identificar mais plenamente como código global.
Quando a sociedade alcançar o decréscimo populacional, haverá uma reposição pelas famílias que concebam um terceiro, ou quarto filho como medida de repovoamento da Terra, e tal honraria deverão ser concedidas como valorização dos genes mais preciosos. Portanto, a população deve retroceder, mas não antes que haja um concurso de vista, de força e de velocidade que valorize as potencialidades genéticas para que a parte boa não se perca. Cada nicho de gene é preciso ser aceito sem discriminação, do gordo ao alcoólatra, que após depurarem os que morrerão da gordura, ou da bebida, proliferarão aqueles que possuem imunidade aos ácidos e ao álcool, substâncias que tanto afetam os insetos, micróbios e germes menores.
A máquina corpórea que habitamos é um desenho de limitações, mas estão nascendo os que têm mais pulo, mais visão e mais olfato que a nossa geração; o fruto mutante da radiação, tão horrível e tão esperto, para prevalecer. Seria equivalente a um mundo surdo em que os homens nada escutassem, e o padrão estético da anatomia humana não conteria as orelhas, até que nascesse um ser de abanos laterais com a percepção dos sons. Valer-se-ia do precioso dom para ser mais perspicaz que os demais, ganhando força e poder até alcançar a predominância genética, extinguindo a raça anterior dos homens sem audição.
As induções genéticas já estão por se iniciarem e seguirão evoluindo sempre obedecendo a gerações de maturação por cada parte do corpo alterada. As nossas conquistas tiveram seus heróis, mas também já não somos bárbaros de se permitir criar seres induzidos, bizarros, em proporção além das que houvesse desde os primórdios da natureza, esse é o passo gradual e seguro. As acoplagens de chips ao cérebro potencializando memória e informação, iniciam a formação de uma casta em nossa sociedade, daqueles que estão plugados em on, dicotômico aos que não estão plugados, que estão em off, e na geração seguinte a natureza nos revelará o que surgirá do seu acasalamento.
Na ciência do futuro haverá uma glândula, despertada ainda cedo pela forte emoção, que de um marcante acontecimento desabrochará, e os imaculados de tal sensação jamais alcançarão a percepção que produz. Darão ao novo homem a percepção integrada do tato, olfato, visão, audição e paladar, além de novos sentidos, inalcançáveis aos humanos normais.
Também haverá os que preservarão a pureza da raça, de seus valores e ideais, servindo como reserva estratégica de um possível recomeço. Outras raças fecundarão numa terra virgem de preconceito, até que certa combinação aconteça; atrelarão a sustentação social pelo amor dos pais para com os filhos, pois é o laço mais forte de que dispõem, afinal são comuns pelo gene e por mais que eu acariciasse meus pais, jamais os amaria como eles me amaram, este é o princípio da família e do amor, que se perpetua nas gerações.